Retirado do blog Loja de consultoria.
Postado em 29 de fevereiro de 2012 por Guilherme Lito
Meritocracia é uma daquelas palavras do momento né? Bonita pra caramba. O bom sobe, o ruim sai. Quem merece ganha, quem não merece não ganha. Simples, justo, eficaz. Isso gera melhoria contínua no sistema e nós somos “justos” ao aplicar o conceito à risca. Mas….. será que as coisas são tão simples assim?
AFINAL, O QUE É MERITOCRACIA?
Antes de começar a analisar o termo, vamos definí-lo. Apesar de ter surgido na Grécia antiga como uma ideologia de governo, Meritocracia, segundo a wikipedia, foi aplicada pela primeira vez 6 séculos antes de Cristo. Confúcio foi o primeiro a dizer, “Galera, vamos ser governados por quem merece e não quem recebeu o cargo por herança?” (não exatamente nessas palavras).
A ideia é tão interessante, que OSHO, um guru/filósofo/homem muito controverso do século passado sugeriu que tanto a democracia quanto socialismo fossem substituidos por um modelo puramente meritocrático. Interessante, não? Mas beleza, o que temos que entender:
a. Meritocracia surgiu na academia (filósofos e estudiosos pensaram nela) depois na prática. Funciona bem no papel. Já vimos isso por aí, né? Vide exemplos desde o sistema econômico vigente à planos de negócios.
b. Meritocracia é uma utopia, algo que é, no máximo, um rumo para a sociedade, não um modelo de gestão para empresas, muito menos algo a ser seguido à risca no mundo corporativo.
Vamos agora aos por quês!
QUAIS SEUS PROBLEMAS?
A meritocracia é tão bonita, tão certinha, faz tanto sentido, que é muito difícil ser (parcialmente) contra. Quem discorda do grande Aristóteles aqui em cima? É como fome zero, qualidade total e outros termos que, isoladamente, são incontestáveis.
Vamos contestar, portanto, utilizando um exemplo da vida real: Estados Unidos da América, o país mais meritocrático do mundo. Lá é a terra da liberdade, no mercado todo mundo pode se comer vivo, o que importa é o “melhor” sobressair no final, o país dos “selfmade men”, certo? Ótimo, meritocracia na veia.
Pois é, o 1% mais rico dos Estados Unidos, entre 1976 e 2007 reteve 58% da grana que foi gerada dentro do país nesse período. Eles detinham 8,9% do que era produzido nos EUA e, em 2007 esse número quase triplicou, chegando a 23,5% da grana. (Fault Lines - Raghuram G. Rajan) E aí, eles “merecem?” Eles trabalharam mais e/ou melhor do que os outros 99% do país? Tenho dificuldade em acreditar que esse 1% merecia 58% da grana!
Em outro ótimo livro “O Mal Ronda a Terra”, Tony Judt mostra como o dinheiro dos pais determinou o sucesso financeiro dos filhos com o passar dos anos. O gráfico segue abaixo:
Esse gráfico diz que, em 2000, quase 35% da renda da população poderia ser explicada ao olhar a renda dos seus pais (Obs: esse índice TRIPLICOU em 20 anos). “Ora”, isso me fez pensar, “se vivemos numa sociedade onde o melhor fica em cima e o pior fica embaixo, por que o fator `grana dos pais` pesa tanto? Por que a riqueza está sendo concentrada na mão de poucos? Eles são uma raça superior? Como a meritocracia acabou gerando um sistema de castas, justamente o ideal oposto ao que nos propomos a ser?!?!”
É aí que a teoria encontra a prática. Se seu pai tem grana, você teve uma educação boa, se teve educação boa, será mais capacitado do que um cara que não teve, portanto é só “jogar cumprindo tabela” que você ficará em cima. E aí, isso é justo? Quem tem mais mérito: (1) o cara que estuda todo dia 12 horas por dia com professores ruins que matam aula e estão desmotivados para trabalhar e, por consequencia, o deixam semi analfabeto ou (2) o playboy que passa metade da vida drogado e buscando mulheres e a outra metade aprendendo com os professores mais gabaritados e no final sabe escrever e falar bem? Quem é “o cara”?
Fechando a parte social/política, como disse o gloriosíssimo e muito mal interpretado Adam Smith, “nenhuma sociedade pode estar se desenvolvendo e feliz, se a grande parte dos seus membros são pobres e miseráveis.” O que a meritocracia obriga é justamente que a riqueza seja concentrada em “poucos e bons”, enquanto os outros pagam o pato num ciclo vicioso. Você é rico e está se dando bem no ciclo? Beleza, então vamos aos últimos gráficos. Este primeiro descreve a relação entre desigualdade financeira num país e problemas de saúde e sociais da população e o segundo, a relação entre desigualdade e número de homicídios:
Alguma relação?!?! como disse Fábio Barbosa em sua palestra no TED:
“Não dá para ir bem indefinidamente num país que vai mal … blindar carro, subir muro e morar em condomínio não vai resolver o problema.”
Se você é um dos ricos que se “beneficia” com o sistema, lembre que seu sucesso financeiro pessoal pode ser o motivo pelo qual você será assaltado na esquina… E não seja infantil de achar que “a culpa é do pivete”. Como aprendemos nas primeiras aulas de biologia, “somos fruto do nosso meio”.
Como diria nosso querido Merovingian (a partir dos 3:00), “Causalidade, não há como fugir dela.. nossa única esperança é tentar entender, entender o por quê.”
Agora vamos à meritocracia nas empresas!
CALIBRANDO PARA NOSSA REALIDADE
É claro que pensar no sucesso de um país ou mundo requer que todos (ou pelo menos a maioria) fiquem bem e, estritamente falando, ao pensar no sucesso da sua empresa você quer o bem dela e de quem lá dentro está, correto? Portanto outros fatores entram em jogo e o problema muda.
11 em 10 livros de gestão que você pegar falarão sobre a importância de se definir metas e etc, e nós inclusive somos à favor disso! Metas tem um valor bom de motivação, costumo compará-las à panfletagem: barato, costuma ajudar muito na venda e tem efeito e duração imediatos.
Agora daí a achar que você poderá tomar todas as decisões da sua empresa baseado nesses números é um salto. Responda às seguintes perguntas:
a. Você consegue medir exatamente o que cada um produziu? Onde começa o trabalho de um e acaba o do outro?
b. As metas são 100% justas e saudáveis? Isto é, faz sentido para o funcionário e, quando ele ficar viciado em só correr atrás dela (acredite, ele vai), sua empresa continuará saudável?
Se você respondeu não a uma dessas perguntas, já viu que o buraco é mais fundo, né? Mas vou te dizer que o problema não está nem na dificuldade de se tomar decisões justas, até porque se você, querido empreendedor, ainda acha que sempre haverá uma resposta justa ou certa para seu negócio, está na hora de desistir desse conceito, que também é utópico! Os dois principais problemas de ser “meritocrático” são:
a. Hiperindividualismo
Quando você “implanta a meritocracia” na sua empresa, basicamente a mensagem que você está passando é “cada um por si e Deus por todos”. Esses sistemas naturalmente fazem com que as pessoas busquem seu próprios objetivos, queiram ser seus próprios “super homens”, reduzindo as interações entre funcionários (e, portanto cooperação que gera valor e relacionamentos que podem ser importantíssimos no futuro) e gera uma selva dentro da empresa. Sinceramente, embora o pessoal daAB Inbev ache lindo as tensões e conflitos internos gerados, isso gera um ambiente extremamente hostil, ou “abrasivo” (como descrito nessa palestra), onde as pessoas entendem que estão num processo de seleção natural. Isso gera muito estresse, um passando a perna no outro e etc. Conheço dezenas de pessoas boas que largaram empresas ditas meritocráticas porque não aguentavam o clima lá dentro.
Lembre-se também que numa startup ou pequena empresa, muitas vezes é imprescindível que pessoas atuem em várias áreas, apaguem incêndios e, muitas vezes inclusive, façam o trabalho do outro. Se você tem uma cultura “cada macaco cuida do seu galho”, será difícil superar as barreiras que surgirão.
Por fim, e talvez mais importante, é evidente que hoje o que gera valor é a cooperação. Tente resgatar seus melhores projetos/feitos e pense quantos deles você fez sozinho…. Ao gerar esse clima de competitividade, você acaba desperdiçando um potencial imenso da equipe gerar um resultado do tipo 1+1 é maior do que 2.
b. As pessoas na sua empresa tem que apertar parafuso o dia todo? Se não, assista a essa ótima palestra do Dan Pink e entenda por que muitas vezes nem vale a pena botar metas financeiras para “motivar”. Para quem está sem tempo de assistí-la, basicamente a ideia é que para problemas fáceis (como apertar parafuso, fazer um maior número de sanduíches, subir escada, etc), dinheiro ajuda, mas para problemas complexos (os que a maioria de nós lida todo dia), o dinheiro gera um incentivo negativo. Comprovadamente pessoas que receberiam dinheiro para resolver um desafio acabavam demorando mais tempo do que os não tinham premiação envolvida. Loucura, não?
Portanto fora penalizar muitas vezes financeiramente, psicologicamente e moralmente de forma injusta muitas pessoas, você ainda gera problemas para você mesmo!
CONCLUSÃO
Meritocracia é uma ideia legal, mas está longe de garantir a prosperidade do seu negócio, melhorar a tomada de decisões ou ser uma ferramenta que invariavelmente te ajuda na produção/venda/qualquer outro objetivo que sua empresa tenha. Por fim, como dito acima, somos fruto do nosso ambiente, portanto ficar olhando os números dos funcionários e tomar decisão em cima deles é fácil, mas pode ser uma péssima ideia. Business é muito mais “soft”, humano, social. Entenda mais desses fatores, e como eles estão pesando na motivação dos seus sócios/funcionários, do que do resto!
O ministério do trabalho adverte: use meritocracia com moderação!
E aí, curtiu? Compartilhe! Comente! Quais experiências você já teve tentando “implantar um sistema meritocrático” na sua empresa?
Saudações Empreendedoras, estamos mudando o mundo! Inté!
Olá.
ResponderExcluirSabe, eu não sou contra a meritocracia. Eu sou contra à meritocracia "de perna quebrada" ao qual a SEEDUC nos impõe. (e entendi perfeitamente o sentido de você ter postado este texto. eu TAMBÉM não atingi as metas.)Num sistema meritocrático que funcione, existe o pressuposto de que TUDO é feito às claras; metas podem ser altas, mas não impossíveis; e em qualquer parte do processo, se por acaso algo está dando errado, existe tempo e assistência para corrigir este erro e transformar aquilo que está em percurso.
Mas isto não acontece conosco. Conosco, a situação é "tem que atingir a meta tal". E ninguém controla mais nada. Somos dependentes de uma "variável" chamada aluno que, se quiser, cruza os braços e diz "não vou fazer e pronto", e que simplesmente aparece uma vez por mês, quando aparece.NINGUÉM nos disse EM MOMENTO ALGUM que a quantidade de alunos que ficam em dependência numa escola é contada como repetente, e jogam "nossa" avaliação para baixo, dentre os muitos exemplos errados desse sistema "manco" que nos submetem.
Mas se "fadados ao fracasso" estamos, então, pelo menos, que fracassemos com dignidade. Ofereçamos ao nosso aluno a melhor educação que possamos dar, a despeito daquilo que nos "orientam" a fazer (que é uma bomba). NINGUÉM pode culpar alguém que oferece o melhor, no MAIS ALTO NÍVEL. Os índices de reprovação serão ainda maiores do que já são, mas em compensação, quem se dedicar aos estudos terá realmente uma qualidade competitiva à altura dos alunos de boas escolas. E a SEEDUC não pode punir porque o melhor é oferecido, e não aquele ensino deplorável que ela está tentando incutir em nossos trabalhos.
Abraço.