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Situação bizarra.
16 de Abril de 2013•07h12
Sem vale-refeição, professores da rede municipal de Sapucaia do Sul (RS) chegaram a fazer greve para que pudessem comer na escola
Às quartas-feiras, a professora Júlia Costa começa o dia às 6h20 para lecionar na Escola Estadual Professora Maria Amélia Guimarães, em Belo Horizonte (MG), onde também trabalha à tarde. Depois, ela segue para outra instituição, em que dá aulas à noite. Finalmente, volta para casa por volta das 23h30. Nessa rotina, a docente tenta encontrar tempo para preparar o almoço que levará para a escola durante a semana, uma vez que não é permitido que professores consumam a merenda escolar.
"Cumpro 32 horas de aulas presenciais por semana e oito fora da sala de aula. Às vezes a jornada fica corrida, não dá tempo de parar para almoçar", conta Júlia. Ela explica, ainda, que muitos professores trabalham nos três turnos, comumente em escolas diferentes e, por perderem tempo no deslocamento de um local a outro, não conseguem reservar tempo para comer.
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Na lei nº 11.947, que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica, fala-se que a merenda é direcionada ao estudante, e o docente não é mencionado. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), responsável pelo programa, explica que o valor direcionado pelo governo é exclusivo para alimentação dos alunos, e que cada localidade deve fazer a gestão da alimentação dos professores e servidores dos colégios da rede pública.
Para reverter o quadro, está em tramitação na Câmara dos Deputados um projeto de lei para assegurar o direito à alimentação escolar aos professores da rede pública de ensino básico. O PL 4427/12, do deputado Jilmar Tatto (PT-SP), altera a lei nº 11.947. Outro projeto, da deputada Sandra Rosado (PSB-RN), já previa a concessão do alimento excedente da merenda aos profissionais da educação. O PL 4427/12 foi agregado ao 3114/12, que será analisado de forma conclusiva pelas comissões de Educação e Cultura e Constituição e Justiça e de Cidadania, conforme informações da Agência Câmara de Notícias.
Professores ficam com as sobras
A professora Júlia afirma que desde 2008 a alimentação dos docentes é uma incógnita em algumas escolas. Na época, apesar de haver a proibição de que os professores comessem a merenda dos alunos, muitas instituições faziam vistas grossas, como ainda hoje acontece. Segundo a professora, em meados do ano passado, a escola onde trabalha foi informada de que a situação não seria mais permitida, mas que os professores poderiam comer, caso sobrasse merenda, após o lanche dos estudantes.
"A questão é que, muitas vezes, não sobra. Nessas situações, nós temos que fazer uma vaquinha para almoçar", relata. Hoje, ela prepara a comida em casa para levar para o trabalho, algo que, segundo ela, tornou-se comum entre os colegas.
O professor como servidor público tem direito a ticket de alimentação ou a receber o benefício por outro meio, e isso deve ser concedido pelo ente público, não precisa ser compreendido na legislação da merenda
Christianne de Carvalho Stroppa
professora de direito administrativo da PUC-SP
A professora Idalina Franco de Oliveira, do Conselho de Alimentação Escolar de Minas Gerais, explica que a situação não é padrão - há instituições que permitem que os professores se alimentem da mesma comida dos alunos, outras não. Ela destaca que, como ocorre na escola em que Júlia leciona, nos colégios que liberam a merenda, essa é oferecida depois que os estudantes comem.
Idalina aponta ainda que a exigência da categoria se dá, principalmente, no sentido de que haja um investimento por parte do Estado na alimentação dos professores nas escolas. "Reivindicamos que haja uma contrapartida do governo estadual. Não queremos sequer questionar se é permitido ou não comer as sobras dos alunos", destaca.
Em fevereiro de 2012, a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais encaminhou às superintendências regionais de ensino um documento com orientações sobre o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), para "reforçar a orientação do Ministério da Educação para a correta utilização da merenda escolar", conforme nota divulgada no site da pasta em março.
A secretaria diz que a proibição de que os professores comam a merenda dos estudantes é uma orientação federal. A pasta esclarece ainda, por meio da assessoria de imprensa, que "todas as reivindicações dos professores são discutidas quando apresentadas em fórum apropriado, como em reuniões realizadas entre representantes do governo de Minas e os representantes da categoria".
Greve
Em fevereiro, a notícia de que não poderiam mais se alimentar da merenda dos alunos foi o estopim para que os professores de Sapucaia do Sul (RS), na região metropolitana de Porto Alegre, declarassem greve, uma vez que a categoria não ganha vale-refeição. Uma professora de uma escola da rede municipal da cidade, que não quis se identificar, explica que os docentes tinham como costume comer junto às crianças e nunca haviam sido informados da proibição até então. O hábito foi vedado após uma denúncia na Justiça.
O impasse foi resolvido por meio de uma lei aprovada na Câmara Municipal que autorizou o fornecimento de alimentação a professores e servidores da educação. No decreto, consta a ressalva de que "as despesas decorrentes desta Lei correrão por conta das dotações orçamentárias da Secretaria Municipal de Educação".
Christianne de Carvalho Stroppa, professora de direito administrativo da PUC-SP, explica que, em termos de regra jurídica, é correto que a merenda escolar seja direcionada ao aluno e não inclua o docente. "Contudo, o professor como servidor público tem direito a ticket de alimentação ou a receber o benefício por outro meio, e isso deve ser concedido pelo ente público, não precisa ser compreendido na legislação da merenda", esclarece, explicando que o governo deve assumir os gastos com seus funcionários.
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